A crença na própria individualidade parece algo inquestionável: "Eu sou eu mesmo, um ser único e singular, com minhas próprias características e pensamentos, certo?".
No entanto, a ciência nos convida a repensar essa visão simplista. Mergulhando nos detalhes fascinantes da biologia, nosso entendimento da individualidade está em constante transformação, desafiando a noção de que somos seres isolados.
Na verdade, somos um mosaico complexo de organismos, uma colônia vibrante de vida em constante interação. Além dos genes herdados dos pais, você é um mosaico de vírus, bactérias e, potencialmente, outros seres humanos. Se você é gêmeo, é ainda mais provável que esteja carregando partes do seu irmão ou irmã dentro do seu corpo e cérebro. Estranhamente, esses fragmentos podem até influenciar o seu comportamento.
Além dos Genes: Uma Sinfonia de Microorganismos
Antigamente, a história da sua origem era simples: seus pais se encontraram, tiveram um momento divertido e, a partir de um pequeno óvulo fertilizado, você emergiu para o mundo. Metade da sua mãe, metade do seu pai – e 100% você mesmo. No entanto, essa narrativa agora se tornou muito mais complexa.
Além dos genes herdados dos nossos pais, somos compostos por uma imensa comunidade de micróbios, incluindo bactérias, vírus e até mesmo células de outros seres humanos. Essa diversidade microbiana, conhecida como microbioma, habita nosso intestino, pele e outros órgãos, influenciando diretamente nosso humor, desejos alimentares e até mesmo comportamento.
Estudos revelam que os micróbios do intestino podem produzir neurotransmissores como a serotonina, impactando diretamente o nosso humor e níveis de estresse. A relação vai além: pesquisas sugerem que esses micróbios podem até influenciar nossos desejos alimentares, nos impulsionando a consumir alimentos que beneficiam sua própria sobrevivência.
Por outro lado, infecções por parasitas como o Toxoplasma gondii podem ter efeitos devastadores no comportamento humano. Esse parasita, conhecido por infectar ratos, os torna atraídos por gatos, seus hospedeiros naturais para reprodução. Em humanos, o Toxoplasma pode estar associado a um maior risco de esquizofrenia e depressão suicida, demonstrando o poder que microorganismos podem ter sobre nossa psique.
Invasão de irmãos
Aqui está o aspecto mais intrigante: seu corpo não apenas abriga micróbios, mas também pode ter sido invadido por outros seres humanos.
O exemplo mais visível pode ser o caso de gêmeos siameses compartilhando um cérebro, mas mesmo gêmeos comuns podem ter órgãos compartilhados sem perceber. Durante o desenvolvimento inicial, as células podem ser passadas entre gêmeos ou trigêmeos. O que antes era considerado uma ocorrência rara, agora sabemos que é surpreendentemente comum. Cerca de 8% dos gêmeos não idênticos e 21% dos trigêmeos, por exemplo, não têm apenas um, mas dois tipos sanguíneos: um produzido por suas próprias células e outro produzido por células "alienígenas" absorvidas de seu irmão gêmeo. Eles são, em outras palavras, uma quimera - uma fusão de dois corpos - e isso pode ocorrer em muitos órgãos, incluindo o cérebro.
Mesmo que você não ache que teve um gêmeo, existem muitas outras maneiras pelas quais você pode ser invadido por células de outro ser humano. É possível, por exemplo, que você tenha começado como dois embriões no útero, mas os gêmeos se fundiram durante o desenvolvimento inicial. Como isso ocorre em um estágio tão precoce do desenvolvimento, as células podem ser incorporadas ao tecido e parecerem se desenvolver normalmente, mas carregam a carga genética de outra pessoa. Em outras palavras, você se parece com uma pessoa, mas tem células de outra pessoa dentro de você - efetivamente, você sempre foi duas pessoas”.
Mesmo na idade adulta, você não está imune a invasores humanos. Alguns anos atrás, Nelson e William Chan da Universidade de Alberta em Edmonton pegaram amostras do tecido cerebral de mulheres e examinaram seu genoma em busca de sinais do cromossomo masculino Y. Cerca de 63% abrigavam células masculinas. "Não apenas encontramos DNA masculino em cérebros humanos femininos como uma observação geral, mas descobrimos que ele está presente em várias regiões do cérebro", diz Chan. Em outras palavras, seus cérebros estavam salpicados de células do corpo de um homem. Uma conclusão lógica é que ele veio de um bebê: de alguma forma, as células-tronco de seu próprio filho passaram pela placenta e se alojaram em seu cérebro. Estranhamente, isso parecia diminuir as chances de a mãe desenvolver Alzheimer posteriormente - embora exatamente o porquê permaneça um mistério. Alguns pesquisadores estão até começando a se perguntar se essas células podem influenciar a mentalidade de uma mãe durante a gravidez.
Essa descoberta desafiadora questiona nossa identidade individual e nos lembra que somos mais do que a soma de nossos genes.
Superorganismo: Uma Nova Visão da Vida
Ao reconhecermos a complexa teia de vida que habita nosso interior, nos tornamos conscientes de que somos superorganismos, entidades compostas por uma multitude de seres em constante interação. Essa visão expandida da vida nos convida a repensar nossa própria individualidade e nossa relação com o mundo.
Por: Jonathan Pena Castro
Fontes: Além das já incluidas no texto, 1
0 comentários:
Postar um comentário